Caso Backer: Fantástico mostra com exclusividade como a contaminação das cervejas aconteceu — Foto: Fantástico
A cervejaria Backer pode voltar a funcionar, segundo informação passada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), na tarde desta quarta-feira (5). O Ministério informou, durante coletiva de imprensa, que a empresa já fez o pedido e, caso cumpra todas os requisitos de segurança, poderá reabrir.
O relatório final divulgado pelo Mapa nesta terça-feira (4) apontou que as contaminações na cerveja produzida pela Backer, em Belo Horizonte, estariam ocorrendo desde janeiro de 2019. A contaminação seria inédita em alimentos no Brasil.
Embora o relatório já esteja concluído, o Ministério explicou que o processo administrativo pode demorar até seis meses para ser concluído e que, ao final, poderá ter sanção de multa para a empresa de R$ 2 mil a R$ 117 mil por lote contaminado. Ao todo, 36 tiveram a contaminação confirmada. Além disso, a cervejaria poderá ainda ter o registro cassado.
Mas o coordenador-geral de Vinhos de Bebidas do ministério, Carlos Müller, explicou que a contaminação já poderia estar ocorrendo antes. “Só temos analises até janeiro de 2019, era o que estava disponível no estoque da empresa”, explica Müller.
Na manhã desta terça, equipes do Mapa, da Polícia Civil e do Ministério Público estiveram na sede da cervejaria em Belo Horizonte. Mais de mil fichas com anotações foram apreendidas. O Mapa disse que essas evidências coletadas poderão ajudar a esclarecer alguns pontos que ainda causavam dúvida sobre os fatos ocorridos na cervejaria. Documentos, que segundo Glauco Bertoldo, diretor do departamento de inspeção de produtos de origem animal, foram sonegados pela Backer.
De acordo com a promotora de Justiça Vanessa Fusco, da esfera criminal, essas fichas serviam para controle interno de produção e traziam anotações de “vazamento de glicol”. O material estava em posse do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) de forma digitalizada.
“Essas fichas não foram entregues pela empresa ao Mapa de forma física, elas foram escaneadas e, quando foram escaneadas, houve uma supressão de algumas anotações. Até então não sabemos se a supressão foi voluntária ou involuntária. Isso ficou nebuloso e o Ministério Público precisava ter acesso físico a essas fichas de produção”, disse a promotora.
Detalhe de uma ficha de produção da Backer, no relatório do Ministério da Agricultura, que contém a expressão “passagem de glicol”. — Foto: Reprodução
De acordo com o Mapa, a hipótese da contaminação ainda em 2019 afasta a possibilidade de “evento isolado”, como vinha sendo afirmado pela cervejaria. Segundo o relatório, as substâncias contaminantes monoetilenoglicol e dietilenoglicol não são produzidas pela levedura em condições normais da produção da bebida.
Ainda segundo o Mapa, as contaminações pelas substâncias não estão restritas aos lotes das bebidas que passaram pelo tanque JB 10, ocorrendo também em cervejas produzidas antes da instalação do equipamento.
Em junho, a defesa da Backer alegou que a responsabilização pela intoxicação por dietilenoglicol deveria se estender aos fornecedores, tanto da substância tóxica, já que a cervejaria alegou comprar apenas monoetilenoglicol, quanto do tanque, que seria novo, mas com defeito.
“A Backer não concorreu para estes dois atos. Não teve culpa do dietilenoglicol entrar, muito menos de ter recebido um tanque defeituoso. A conclusão do inquérito não corresponde com as provas que foram carreadas”, afirmou na ocasião.
Durante a coletiva a imprensa nesta quarta-feira, o Mapa ainda informou que a hipótese levantada pela Backer de outras marcas também estarem com a cerveja contaminada foi descartada. Amostras de diversas outras cervejarias foram analisadas e nenhuma foi encontrada contaminação do dietilenoglicol e monoetilenoglicol.
Para o Mapa, a cervejaria teria adotado “práticas irresponsáveis ao utilizar líquidos refrigerantes tóxicos de forma deliberada em seu estabelecimento, utilizando-os em detrimento de alternativas atóxicas, como propilenoglicol e álcool etílico potável.”
O órgão apontou que a Backer possui falhas nos sistemas de controle e gestão, com informações incompletas nos relatórios de produção.
O inquérito policial, concluído em junho, aponta 29 vítimas intoxicadas por dietilenoglicol após o consumo de cervejas da Backer. Dessas, 10 morreram. Perícias realizadas na empresa constataram vazamento em um tanque e diversos outros focos de contaminação.
Produtos recolhidos
Em janeiro deste ano, quando os casos de intoxicação vieram à tona, o Ministério da Agricultura apreendeu, nas dependências da Backer e no comércio de Minas Gerais, 79.481,34 litros de cerveja, de várias marcas e diversos lotes, com presença dos contaminantes. Destes, 56.659 garrafas apresentavam riscos aos consumidores.
Já no Espírito Santo, onde a cerveja também era vendida, 9.047 garrafas contaminadas foram retiradas do mercado.
Os procedimentos para apuração de responsabilidades na esfera administrativa já foram iniciados e seguem os ritos processuais legalmente previstos.
Investigações
Coletiva Caso Backer — Foto: Fernando Zuba/Globo
Após cinco meses de investigações, no início de junho, 11 pessoas ligadas à cervejaria Backer foram indiciadas pela Polícia Civil de Minas Gerais pela intoxicação por dietilenoglicol em cervejas da marca. Entre os crimes, estão lesão corporal, contaminação de produto alimentício e homicídio.
Segundo o delegado Flávio Grossi, a Polícia Civil conseguiu comprovar, física e quimicamente, a existência de um vazamento no tanque de cerveja.
Após a conclusão do inquérito, cabe ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) decidir se apresentará ou não denúncia à Justiça contra os indiciados, o que ainda não ocorreu.
De acordo com o MPMG, há dois processos em andamento, ambos sob os cuidados da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor de Belo Horizonte.