Profissionais de saúde iniciaram nesta quarta-feira (3, horário local) uma greve nacional como forma de desobediência civil contra o golpe militar em Mianmar, e anunciaram que só voltarão a trabalhar nos hospitais do governo quando os militares deixarem o poder.
Os serviços foram paralisados até mesmo no laboratório nacional que analisa testes de Covid-19.
“Enfermeiros, médicos, fisioterapeutas e estudantes resistirão, pacificamente, mas firmes”, segundo comunicados divulgados em redes sociais, apesar das restrições no acesso à internet.
O movimento dos profissionais de saúde se soma a outros protestos da população. Na terça-feira, houve um protesto contra o golpe com buzinas e panelaço em Yangon, a maior cidade do país.
Bater panelas, ou qualquer objeto barulhento, é um costume asiático muito difundido às vésperas do ano novo lunar (mais conhecido no ocidente como ano novo chinês) com o intuito de se livrar de fantasmas e energias malignas, de acordo com Thuzar Nyein, pseudônimo adotado por estrangeira que mora na cidade e falou ao G1.
“O golpe de Estado em Mianmar não teve nenhuma grande reação de resistência popular até o momento, mas não se enganem. A população birmanesa está atenta e forte. A força desse povo, no entanto, não se dará pelo ódio ou pela violência”, afirma.
“O golpe atingiu em cheio o coração de quem já enfrentava uma grande batalha contra a pobreza, os conflitos étnicos e religiosos e agora a Covid 19”, acrescenta. “Mianmar resistirá ao golpe de Estado, recua em silêncio para estrategicamente avançar em seus propósitos. Para isso se utiliza de estratégia e não de violência”.
Na terça, o principal aeroporto do país, o de Yangon, foi fechado e teve sua permissão para voos revogada até maio, inclusive os de socorro.
O Conselho de Segurança da ONU vai se reunir na quinta para debater o golpe militar no país asiático, que faz fronteira com China, Bangladesh, Laos e Tailândia no sudeste da Ásia.
Golpe
Mianmar, que tem cerca de 50 milhões de habitantes, vivia uma fase democrática desde 2011, depois de quase 50 anos de regime militar. Naquele período, uma junta militar governou o país.
De 2011 para cá, haviam sido implementadas eleições para o Parlamento e outras reformas.
O golpe de segunda-feira ocorreu sem atos de violência e poucas horas antes da primeira sessão do Parlamento formado nas eleições de novembro.
Os militares bloquearam as estradas ao redor da capital com tropas, caminhões e veículos blindados, enquanto helicópteros militares sobrevoavam a cidade, e derrubaram o sinal de internet e telefonia móvel em todo o país.
Na segunda-feira, eles detiveram membros do NDL e líderes civis de Mianmar (inclusive Aung San Suu Kyi e o presidente, U Win Myint), juntamente com ministros, governadores regionais, políticos da oposição, escritores e ativistas.
Daw Aung San Suu Kyi
Daw Aung San Suu Kyi era, na prática, a líder do país desde 2015. Oficialmente, o cargo dela é o de presidente do NDL, o partido civil.
Ela é a filha de um herói da independência do país, o general Aung San. Durante o regime militar, Aung San Suu Kyi ficou presa durante 15 anos. Ela venceu o prêmio Nobel da Paz em 1991, quando estava em prisão domiciliar.
Ela só saiu da prisão em 2010. Depois de sair, tornou-se líder do país.
General Min Aung Hlaing
Nesta segunda-feira, quem tomou o poder foi o general Min Aung Hlaing, chefe das forças armadas do país. Na teoria, ele deveria ir para a reserva neste ano por completar a idade compulsória para se retirar da ativa.
Mesmo depois do fim do regime militar, em 2011, as forças armadas nunca ficaram sob o controle do governo civil. Nos últimos anos, o exército, controlado pelo general Min Aung Hlaing, empreendeu campanhas contra minorias, como os rohingyas, os shan e os kokang.